terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

SPOTS TO GO #5

Corações à mesa

Chegou à Mesa do Bairro e o Luís estava à porta à sua espera com um sorriso rasgado. Cumprimentou-a com um beijo. Mariana sentiu o seu perfume fresco e amadeirado que lhe trouxe à memória só coisas boas. Sentiu-se feliz. Que estranho! Sim, era essa a palavra: feliz. Rapidamente boicotou o pensamento.
Mas este rapaz está sempre de bem com a vida? Está sempre assim: sorridente,  pontual, bem cheiroso? Alguém aguentará isto? Começamos mal este jantar, pensou.  

Quando falaram ao telefone, umas semanas atrás Mariana manteve-se reservada e desconfiada. Nem queria atender o telefone. Um encontro agora, ainda com a relação com o Tiago, terminada é certo, mas tão fresca, não era bom para ela. O ideal era manter-se sozinha, refletir bem na vida, acalmar o coração e passar mais tempo consigo própria, sem conciliar agendas e sem fazer cedências. Tempo para redescobertas. Mas o Luís desarmou-a convidando-a para jantar, e, pensando bem, conhecia o Luís há anos, amigo do irmão ainda para mais. Não era encontro nenhum. Era simplesmente um jantar.

A escolha do restaurante foi do Luís e uma agradável surpresa! Localizado perto do Campo Pequeno e atrás da Culturget (Caixa Geral de Depósitos) num bairro de pequenas vivendas que se estende até à Praça de Londres, oferece comida regional com um toque de contemporaneidade numa ementa criada em colaboração com o Chef Luís Baena. A entrada faz-se pela garrafeira do restaurante, no piso térreo com uma ampla seleção de vinhos (mais de 70 referências) que se podem escolher para acompanhar a refeição antes de subir ao primeiro andar, e, se houver bom tempo, ao terraço ao ar livre.

- Vamos? A nossa mesa deve estar pronta.
Mariana estava distraída, observando alguns rótulos na garrafeira e pensou que deveria ter trazido outra roupa, afinal. Estava muito casual. Mas depois uma voz interior relembrou-a que não era um encontro, mas um simples jantar e por isso estava muito bem assim. Esperava descobrir todos os defeitos do Luís rapidamente e acabar cedo o jantar.

O espaço do restaurante, no primeiro andar era muito acolhedor com mesas redondas que promovem sempre mais o convívio, uma parede de madeira com relevos e parte da cozinha à vista dos comensais.
- Mariana, tenho algumas sugestões para fazer de entrada. Ora vê lá se concordas.
Começaram por pedir então peixinhos da horta (4,00€) e croquetes de vitela (4,00€). De couvert foi servido um saquinho de pano com três variedade de pão, húmus, manteiga de ervas, azeite e azeitonas temperadas (1,75€). Mariana pediu um prato delicioso experimentando o Mil Folhas de bacalhau com grão ao sabor da Meia Desfeita (12,00€) e o Luís optou por um bife da vazia com molho à Marrare que acompanhou com batatas aos palitos grossos (14€). O serviço revelou-se sempre atento e discreto. Apesar do restaurante encher, nunca se tornou demasiado barulhento.

Falaram o jantar todo. Não houve afinal silêncios constrangedores, nem vontade de apressar o jantar. Relembraram alguns episódios de quando eram pequenos e algumas peripécias em férias no Algarve com as famílias. Falaram de expectativas de futuro, de notícias de atualidade e de viagens se o tempo e o dinheiro não fossem obstáculo. Mariana nem se lembrava da última vez que se tinha rido tanto! Sem pressas, sem horários, sem filtros. Sentia-se tão bem ali a viver aquele momento. Com o Luís. Mais tarde a conversa avançou para o tema relações. O Luís quis saber se estava bem e reforçar que poderia contar com ele. Ele próprio também tinha terminado uma relação recentemente, de menos tempo, mas não menos intensa. Não quiseram saber pormenores. O aqui e o agora importava mais.

- Sabes Luís, li uma frase que dizia mais ou menos isto: mais importante que a companhia para a sexta-feira à noite é a companhia para todo o dia de sábado. E é cada vez mais o que sinto.
- Mariana, não poderia concordar mais. É sinal de que estamos mais maduros? Talvez. Mas o que é certo é que não podemos fazer exatamente as mesmas coisas e esperar resultados diferentes. E aplica-se também às pessoas com quem nos relacionamos. Parece-me muito simples. A ti não?
Não podia deixar de concordar, mas ao ouvir as palavras da boca do Luís pareceu-lhe que ele via tudo muito claro, tudo era muito simples, e, na vida, nada era a preto e branco.
- Vamos para as sobremesas? Tens coragem?
Dividiram duas sobremesas: torta de laranja, novidade na carta, (4,50€) muito suave com um sabor forte a laranja que desenjoava do jantar e a versão da casa de pastel de nata com gelado de canela que foi uma opção mais doce que não desiludiu (3,00€).
Terminaram com dois cafés e com  o Luís a insistir para oferecer o jantar.

Que jantar maravilhoso! Mariana não pode deixar de sorrir.
Há dias atrás não queria combinar nada, há horas atrás estava relutante em vir ao jantar e desejou que terminasse rápido. Mas não controlamos tudo. As palavras seguintes saíram da sua boca disparadas como flechas, firmes e seguras. Já não podia voltar a engoli-las:

- Vamos repetir? Para a semana vamos marcar alguma coisa?
- Por mim sim. Próximo fim-de-semana estás por Lisboa? Há um miradouro que gosto muito e se quiseres podemos lá ir.

Olhou-o nos olhos e quis parar o tempo.


Mariana Reis



  
Mesa do Bairro
Comida regional portuguesa
R. Reis Gomes, 10 | São João de Deus | 961 459 220
25€ por pessoa aproximadamente
De segunda a sábado das 12:30 às 15:00 e das 19:30 à 00:00
Domingos apenas para almoços
Reserva recomendada
Aceita cartões


  
"Que o amor de olhos vendados encontre o caminho para a sua vontade."


William Shakespeare 





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